cozido

o verbo ferve
na nervura do músculo
que teso frija
à altura do ósculo

mudo

se as palavras ferem
e as peles se aceitam
seja o silêncio
nosso escudo

delicada

se me beija
gomos, pétalas
e botão
sou pele
e mais nada

dedicada

faço tudo de mansinho
para ver se esse momento
passa bem devagarzinho

trópico

colo que dobra-me
beirando a devoção
é calor úmido
é banho de suor
e chuva
em tarde de sol
a pino.

textura

minha pele
arrepiada
sob a sua
mordedura

aflita

das juras sobraram
as falas não ditas
os olhos nos olhos

como criança que grita
proteja-me, amor!

natureza morta

rubras reluzem sobre o móvel turvo
maçãs numa cesta ovalada copulam
livres e notívagas, quem há de punir?

impuras não atingiram chão ou céu
perdem-se no pecado de serem suas
maduras e nuas sob moldura de papel.

me deixe solta

já passei do ponto de querer amores eternos, dois dedos de prosa depois do sexo não é nada mal, até presume-se estima. os laços que me prendem desatam-se do ser amado, mesmo que encontre o gozo, prazer maior em seu corpo, não há o que me prenda a ele. nem os batentes de porta ou o sufocar de seu braço. minha essência tem cheiro de láudano e evapora como. me deixe solta! se quer se deitar comigo, não só por uma noite, entenda que os olhos me prendem mais que abraços e quem tem coragem de fechá-los diante de mim, possuirá meu sorriso enquanto eu viver. não choro ao sair, deixe a porta sem tranca para que eu não precise fugir. só deixo para trás o cheiro de meus ais grudados em colcha sua!

ama quem te ama

então não trago culpa
de ser assim tão leviana

meu

ele cheira mato
ele cheira-me
ele cheira mata


mata-me
de amor

instinto

não me atenho
ao cavalgar
encanta-me
a doma

abstrato

estou frágil e me engano
tantas são as cores
que pincelam a ilusão
que é fácil baixar a guarda
minha capital é caos
nalguma falésia sua

cativo

noites em claro
são manhãs rubras
quando contigo

míngua

oro abundância
e só tenho sal
do teu suor
no meu umbigo

in-voluntária

és em mim
sentimento
de dentro
pra fora

defloras

in-timidez

.
entre o íntimo
e os deuses
- ín-timidez -
escravo da tez
que me intima
.

matelassê

deitamos na trama
fiados por torção
flutuamos livres
no meio de nós
dois tecidos

retórica

sustenta na língua
o irremediável
o universal signo
e o toque que me cala

origami

dedos trabalham
a figura profana
é meu antônimo
em dobraduras
de papel

átrio

quero-te aqui
desvio e atalho
cardio e adro
destino final

cravo

rubro distendido
entre meu dente
e palato

entardece-me

estio

seca
tua língua
em esporos
meus

afago

lento invasivo
toma-me noite
sarrafo
glória
açoite.

quintas

em vilas baldias
perco-me em línguas
e todas elas
latejam seu nome.

devassa

.
vulva minha
e de todos os pênis
- devassa vulva -
arregaça as mangas
e não descansa.
.

de Vênus

foi-se o tempo
que quis anéis
hoje só sei
do cheiro de látex

Delta Vênus

.

pelo vê

do teu sexo

vejo

meu mundo

.

em tua vela

revela-se meu barco

a navegar

por teu continente

.

inteira

em silêncio
entrego-me
sem culpa


Kama Sutra

esfinge torta

devoro-te
sem saber
quem és

antigo

sou sistema
solar mestiço
na translação
de seu umbigo

desata

a linha da boca
ao peito
e se não me advinha
nada feito!

náufrago

está afogado
e ora vivo
entre os ss
de meu nome

agrado

visto-me de rendas
se quero-te
meu escravo

breviário

em suas orações
sempre gozei
de liberdade:
polução

metade

paga-me beijo
com beijo
língua com língua

e em gozo
divide-me
ao meio.

carmim

em cores rubras
seu nome está
encarnado
entre meus lábios
em minha vulva.

rósea

despetalou-se
entre meus
dedos frios

in natura

o amor perde
rápido
e perdido
não se consuma

átrio

quero-te aqui
desvio e atalho

destino final

cozido

o verbo ferve
na nervura do músculo
que teso frija
à altura do ósculo

onda

dei-te a falha
onde te calas
deixa o vento

preterido

do verbo passado
entre outros
esquecido

impune

vislumbra pouca veste
e o toque profundo
que me deste

traga seu peso
e leve de mim apenas
meu perfume

sol

deita-me poros
e declina tardio

procuro-te olhos
no horizonte vazio.

origami

dedos trabalham
a figura profana
é meu antônimo
em dobraduras
de papel